domingo, 22 de novembro de 2009

Escrever Para Quem?




O artigo que me proponho a fazer vem ao encontro da necessidade de esclarecer algumas dúvidas que tenho, e que muitas pessoas têm, com relação aos textos que tenho lido ultimamente.
Certa vez, em um seminário, debatíamos um artigo colocado em pauta para uma de nossas sessões de doutoramento. O artigo proposto partia de uma tentativa de explicar a reforma educacional de 1905, em Portugal. Texto interessante que tentava, e penso que conseguiu, depois de muitas interpretações dos componentes da mesa, mostrar historicamente como esse processo deu-se dentro da história educacional de Portugal. Quero ressaltar que o autor do artigo era doutor no assunto que se propunha a escrever. Mas nisso tudo tinha um detalhe que prejudicou todo o artigo e nos deixou horas falando dele: o autor não sabia colocar o que queria dizer.
Um artigo científico para ser considerado como tal deve seguir o esclarecimento de algumas questões estruturáveis. E o guião estrutural parte da problemática, se é clara com seus objetivos e relevancia da mesma; da fundamentação teórica, se esta é adequada ao problema e atualizada, da metodologia, se está devidamente explicada e adequada; escolha dos participantes, se os dados foram bem recolhidos e são apropriados; bem como se as conclusões sustentam o estudo. Todavia, por maior que sejam os dados e o tempo dedicado ao assunto, se nada disso for bem explicado, tudo parecerá um labirinto sem saída .
Eco (2008:161) deixa-nos claro que devemos ser humildes na hora da escrita. Explico.
Caso eu resolva fazer um artigo literário para uma comunidade de literatos, não seria muito relevante fazer um histórico da literatura. Primeiro, porque estaria sendo redundante e em segundo porque estaria subestimando meus leitores quanto ao saber histórico da literatura.
O que acontece na maioria dos casos, seja com artigos científicos ou não, é que nossos “escritores” pensam que todo mundo sabe do que eles estão falando. E isso tudo me lembra aquela professora de um curso de licenciatura em Letras, que entra em sala de aula, olha para seus alunos e diz: “Como vocês já sabem, Camões foi o maior poeta português de todos os tempos. E todo mundo se olha e pensa: Foi? Aliás, essa afirmaçao que todo professor tem que afirma o saber como se todo mundo tivesse a obrigação de saber é muito fora de contexto deixando qualquer um sem graça e para além disso insenta o professor de ter de explicar.
É claro que se essa pergunta fosse feita em uma turma de matemática seria pior ainda, mas quem garante o conhecimento do aluno de Letras sobre Camões? E o melhor a pensar: qual o grau de saber desse aluno. Não podemos dizer que ele seja conhecedor de Camões só porque está cursando Letras. Supomos que um aluno matriculado em Letras saiba sobre Camões muito melhor do que uma questão de algebra, mas isso não garante que ele saiba que Camões foi o maior poeta português e muito menos como se tornou o maior. Logo, sempre é importante colocar para os alunos os fatos das coisas e como elas são e porque são.
Da mesma forma quando escrevemos. Não devemos supor que nosso leitor tenha uma varinha mágica e de nada custa fazer uma revisão rápida e clara sobre o que estamos mencionando em nosso texto.
Por fim quero falar de um professor de Teoria Literária que tive.
Começávamos nosso primeiro semestre em Letras e uma das nossas primeiras cadeiras dentro do curso era com um gênio em Teoria Literária, ele era realmente bom, enquanto conhecedor no assunto. Fato esse que só vim a descobrir anos depois quando efetuei muitas leituras sobre a cadeira.
Então, nosso professor era ótimo, todavia começou a sua disciplina falando em José de Alencar e dos arquétipos. Não sabíamos do que se tratava e que representavam as qualidades positivas e negativas que existinham dentro de cada personagem de Alencar. Todos nós sabíamos quem tinha sido Alencar, alguns já tinham lido na adolescência, outros na revisão do vestibular. Considerando que todos eram iniciantes e por mais que disséssemos ter lido muito sobre Alencar, existia um percurso de “mil anos luz” até nós(iniciantes), Alencar e os arquétipos.
E o pior não era somente isso, como se não bastasse os arquétipos passaram a existir em nossas vidas do nada e sem antecedentes.
Devemos sempre pensar no leitor quando escrevemos e sempre no aluno quando explicamos, caso contrário corremos o risco de tudo que dissermos não fazer sentido para ninguém, afinal a linguagem é uma metalinguagem, ou seja, uma linguagem que fala de outras linguagens.

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